sábado, 26 de fevereiro de 2011

Não pesa que vivas, ou ames

Não pesa que vivas, ou ames
Em torno do simples atraso
Oh, que alegrias infames
Essas do mero acaso.

Que a sorte nos fez loucos
Desfaz o chão ao olhar
Não ames, então, aos poucos
Fá-lo a multiplicar.

Nos cúmplices e soltos tempos
Deixa rezar a quem o quer
Qual sorte, doces momentos
Do açúcar de viver.

Ricardo Costa

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Fragmentos

1

O som que o nada faz,
ferve de solidão,

e só se ouve, quase,
o nó da garganta a estalar

para lá do céu morno.

2

Grande
e
Pequeno

Assim é o coração
como um cego o vê.

3

Tu vais e vens
como quem vem e vai

e é assim, vazia,

que te assemelhas a mim

4

As horas dizem as horas
que o medo cura com sono

se é de relógio errado

fecha os olhos e dorme
com medo de acordar morto!

5

Os mares são tantos como são os céus,
só que nínguem se importa.

Ricardo Costa

/19.

Em cada lágrima tua
há um comboio
que me leva onde os pés
não chegam

Ricardo Costa

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Quando acaba é........Fim!

Fim. Quando tudo se acaba
E pouco não se arruinou
O que fica, sendo nada
é, mesmo assim, o que ficou.

Ricardo Costa

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Dos muros

Não temos o mar
que fazem os muros

- nem eu

Ricardo Costa

Os instrumentos da loucura

Que chorem as demências
no atroz
derrame das palavras

Que se dê aos loucos
o silêncio dos mortos

e os deixem beijar
o chão
como quem planta diamante

Ricardo Costa

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Só a sonhar (Glosa)

Lembro-me ou não? Ou sonhei?
Flui como um rio o que sinto.
Sou já quem nunca serei
Na certeza em que me minto.

Fernando Pessoa - Lembro-me ou não? Ou sonhei?


Lembro-me ou não? Ou Sonhei?
A noite por mim a ir
Como uma vida que não terei
Um vazio lentamente a fluir.

Flui como um rio o que sinto
E nem sei se Homem sou
E não é nada que seja distinto
O que de mau ainda ficou.

Sou já quem nunca serei
Uma coisa sem o preenchimento
Uma coroa sem o Rei
Um pedaço de vadio desalento.

Na certeza em que me minto
Julgo não me acreditar
Que o que lembro, já não o sinto
Que o que sinto, já é sonhar!

Ricardo Costa

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Um poema

O poema acaba sempre que devia começar. No início
Deixem-no vaguear pela tinta de toque suave
Letra a letra, palavra a palavra. Sem desperdício
Até que o ponto do fim apareça e o acabe.

Deixem-no dormir de sono, e hibernar na solidão.
Comecem a leitura a meio e acabem onde começa
Aí sim, desapertem as correntes ao coração
E recebam o fim, que do papel tropeça.

Ricardo Costa

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Não fui quem julguei ser

Fui tudo que não pude ser
Concluindo, não fui nínguem
Morri sem sequer viver
esquecido de ser alguém.

Alimentei-me de pensamento
Já que morto estava
Engordei de desalento
E lembrei-me de ser nada.

Tivesse eu sido vivo
E lembrado de esquecer
Que mesmo se esquecido
Não fui quem julguei ser.

Ricardo Costa

Loucura não é mais que uma maneira de amar

Enalteço a loucura
pesam os tijolos
e os relógios errados

pelo chão
um coração molhado

pelo ar
um nome que não se lê

loucura
não é mais que uma maneira
de amar.

Ricardo Costa

o passar

Um Outono é tão breve de segurar!
Os seus sóis doirados olhamos
de fascínio preso; passamos
à fantasia que é relembrar.

Depois da noite, cresce
O desprevenido da excitação.
Se nada é Inverno que nos tire o sono!
Que levemente desaparece
Tais os cordões do coração
Que se vão rendendo ao abandono!

Uma folha entre o sonho e a poeira
Da Primavera em enlaces falsos
O estender na relva molhada
O ligeiro prazer da cilada
Do molhar dos pés descalços
Quando o Verão aquece na areia.

Ricardo Costa

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Levanta-te, pois quero que acabes

Levanta-te, pois quero que acabes
Se me dóis tanto como pesas
Saudade, antes que me mates
E reclames proveito de tuas proezas!

Ricardo Costa

Inverno

Passeia na floresta densa
Um som de ouvido mouco
Uma sonoridade intensa
de um rugido quase rouco.

Abraçando-se no arvoredo
espreguiçando-se pelo chão
Um início em segredo
Do final de uma estação.

Ricardo Costa

Frio da noite esquecida

Um frio solto vagueia o ar
Indistintamente contra o céu
Que vai indo com o luar
Nada ficando que seja meu.

Leves poeiras cruzam pelo vento
Vagas nesse mar de saudade
Sem vela, triste desalento
da pobre mentira da realidade.

Como se de tudo mais houvesse
Uma aragem de calma despida
Já que não mais o tivesse
- O frio da noite esquecida.

Ricardo Costa